sábado, 22 de agosto de 2009

TRANSFERÊNCIAS DO INTERIOR


Central de Leitos desconhece 84% das internações

Maria Lucivânia Ferreira foi encaminhada para a Meac pelo médico de Ocara sem o conhecimento da Central de Regulação de Leitos

Maternidade-Escola: bebê prematuro e com baixo peso recebe os cuidados de profissionais de saúde na UTI

Prefeitura de Fortaleza vai chamar 18 médicos neonatologistas aprovados no concurso realizado ano passado

Grávida de sete meses, Maria Lucivânia Ferreira de Sousa, de 27 anos, começou a sentir contrações nas primeiras horas da manhã de ontem. Por volta das 11 horas, procurou o posto de saúde, na sede municipal de Ocara, distante 98 quilômetros de Fortaleza. Lá, o médico de plantão, após constatar o risco de parto prematuro e perigo para a futura mãe e bebê, não teve dúvidas, acionou a ambulância e enviou Lucivânia para a Maternidade-Escola Assis Chateubriand (Meac).

A ação poderia ser simples e segura, se não fosse por um detalhe: a transferência feita sem o conhecimento da Central de Regulação de Leitos da Secretaria da Saúde do Estado (Sesa). Lucivânia correu perigo na estrada. Por uma hora e meia, tempo que durou o trajeto, pensou que fosse morrer e pediu a Deus para, quando chegar, ter um parto seguro e, se necessário, um leito de UTI para seu filho. Suas preces foram acolhidas. A Meac, sem ter como negar, atendeu a gestante, estabilizando sua condição e depois a encaminhou de volta para a sua cidade.

O caso de Lucivânia é mais um que acontece sem passar pela regulação da Central de Leitos. Documento denunciando o descaso foi entregue à promotora de Justiça, Isabel Maria Salustiano Porto, pelos representantes da Sesa e do hospitail César Cals e da Meac, durante audiência, na sede do Ministério Público, sobre a falta de leitos neonatais nas unidades de saúde de Fortaleza.

Segundo a denúncia, de 100 pacientes vindos dos hospitais do Interior do Estado, 84 ignoram a Central de Leitos. "É um absurdo. Os médicos e autoridades de saúde dos municípios não respeitam a ética e apostam que aqui, os hospitais não podem negar atendimento", desabafou o secretário-adjunto da Sesa, Marcelo Sobreira.

A diretora da Meac, Zenilda Vieira Bruno, avaliou que a atitude, prática comum em quase todos os municípios, coloca em risco não só a vida das gestantes e bebês, mas toda a rede de saúde. "Sem aviso ou sem saber se existe vaga, mandam o paciente para a Meac ou César Cals, desrespeitando qualquer regra básica de segurança".

O presidente do Conselho Regional de Medicina (Cremec), Ivan Moura Fé, se diz surpreso com o fato em razão das inúmeras palestras e cursos ministrados pela entidade no Interior sempre com o tema: transferência com segurança e sob a coordenação da Central de Leitos.

O médico adianta que irá requisitar da Sesa o teor do documento para depois decidir qual o caminho a seguir com relação aos médicos que ignoram o princípio ético da profissão.

Sobreira, chamou a atenção dos gestores municipais de saúde durante a reunião, realizada na tarde ontem, na sede da Secretaria. "Foi um puxão de orelhas para que isso não volte a acontecer", ressalta.

A promotora de Justiça confirmou o recebimento da denúncia e disse irá tomar medidas. "Vamos conversar com os gestores quando resolvermos o problema da falta de leitos e de neonatologistas na rede".

Esse, por sinal, foi o assunto principal da audiência no MPE. A dificuldade em contratar especialistas foi colocada pelos representantes da Sesa e Secretaria Municipal de Saúde. O problema inviabiliza o funcionamento de mais 15 leitos de UTI neonatal no Hospital Geral de Fortaleza (HGF).

O Estado tenta contratar 26 médicos e o município e Fortaleza, 18 neonatologistas do último concurso público, realizado há um ano. No total, foram abertas 176 vagas. Todos os aprovados foram convocados, mas somente 101 assumiram.

O valor cobrado pelos médicos para um plantão de 12 horas também complica a negociação. O Estado oferece R$ 760,00 e a categoria quer R$ 1,3 mil. O assunto pode ser resolvido na próxima terça-feira, em reunião na Procuradoria de Justiça.

SAÚDE NEONATAL
Esperança de recuperação

Grande parte das mães dos bebês internados em leitos de Unidade de Terapia Intensiva alternam momentos de intensa angústia e esperança na expectativa da recuperação dos filhos. Na ala de espera das UTIs, as mães dividem experiências e relatam que, apesar da lotação, os filhos estão bem assistidos.

A adolescente Taiane da Silva, de 15 anos, mora em Jaguaribe, fez o pré-natal em quatro consultas lá mesmo, mas teve o filho de forma prematura na Maternidade-Escola Assis Chateaubriand (Meac) com seis meses de gravidez. O bebê Pedro Lucas está internado na UTI há um mês e quinze dias sem previsão de alta.

"Tive sangramento e entrei em trabalho de parto com seis meses. Meu bebê está mais ou menos, teve infecção grave, está com 930 gramas. Vejo menino chegando aqui de todo jeito, está lotado sim, mas sei que ele está sendo bem tratado", disse Taiane, que passou 43 dias internada, retornou para Jaguaribe após a alta, mas arranjou carona no carro da saúde municipal para vir para Fortaleza ver o filho. "Não vejo a hora de levar meu filho recuperado e com saúde para casa", conta.

Já Erilene Abreu Tavares, de 24 anos, de Aratuba, mãe de Maria Gabriela, que nasceu de sete meses no dia 2 de agosto, estava aliviada e feliz porque a sua filha ia ser transferida da unidade de médio risco para o berçário. A menina nasceu com 2,3 quilos, mas perdeu peso por complicações e encontra-se com 1,8 quilo. Ela conta que, antes, as unidades estavam muito lotadas, mas que agora estavam mais tranquilas.

UTI neonatal

A superlotação nas UTIs neonatais já é uma constante nos hospitais. Institucionalizou-se na saúde pública o fato de os bebês serem internados em leitos improvisados, acima da capacidade física das unidades. Ontem pela manhã, na Maternidade- Escola Assis Chateaubriand (Meac), havia dois bebês extras na UTI, que tem capacidade para 21 leitos.

Foram transferidos dois bebês, sendo um para a unidade de médio risco da mesma maternidade e outro para o Hospital Waldemar de Alcântara. Na unidade de médio risco II estavam internados 16 bebês.

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